Considerações sobre a alienação fiduciária superveniente
- Renata Josino
- 19 de mar.
- 5 min de leitura
Atualizado: 25 de mar.
A possibilidade de alienação fiduciária da propriedade superveniente surgiu com o advento da Lei nº 14.711/2023, conhecida como Marco Legal das Garantias, permitindo que um único bem imóvel possa ser dado em garantia na modalidade de alienação fiduciária para mais de um contrato/credor. Importante atentar que todas as alienações fiduciárias (gravames) poderão ser registradas na matrícula do imóvel, mas somente a primeira alienação terá eficácia plena, conforme melhor abaixo será explicitado.
A sua utilização poderá estar atrelada a todos os instrumentos usualmente utilizados pelo segmento, como: CCB, Contrato Mãe, Nota Comercial, e etc. O tipo de instrumento vinculado em si não gera alterações na higidez dessa alienação fiduciária superveniente.
A alienação fiduciária é um instituto em que o Devedor Fiduciante transfere a propriedade resolúvel do imóvel ao Credor, permanecendo na posse deste bem até a liquidação do contrato ou consolidação da propriedade em favor do Credor.
Desta forma, essa propriedade transferida ao Credor Fiduciário não poderá ser dividida, compartilhada com outro Credor, este de 2º grau.
O Credor Fiduciário Superveniente possuirá então uma expectativa sobre esta propriedade se houver a liquidação/extinção do contrato firmado com o Credor Fiduciário, passando automaticamente a se tornar preferencial.
§ 4º Havendo alienações fiduciárias sucessivas da propriedade superveniente, as anteriores terão prioridade em relação às posteriores na excussão da garantia, observado que, no caso de excussão do imóvel pelo credor fiduciário anterior com alienação a terceiros, os direitos dos credores fiduciários posteriores sub-rogam-se no preço obtido, cancelando-se os registros das respectivas alienações fiduciárias. (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
Se trata de uma modalidade em que o devedor pode comprometer a propriedade futura do imóvel como garantia para uma nova dívida, mas a garantia anterior tem prioridade sobre a posterior.
Contudo, conforme a própria redação trazida no §3º do art. 22 da lei 9514/97, esta alienação de 2º grau só se tornará eficaz quando a anterior for cancelada.
§ 3º A alienação fiduciária da propriedade superveniente, adquirida pelo fiduciante, é suscetível de registro no registro de imóveis desde a data de sua celebração, tornando-se eficaz a partir do cancelamento da propriedade fiduciária anteriormente constituída. (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
Ainda, é importante ressaltar que em caso de RJ o crédito permanecerá sendo extraconcursal, mesmo nos casos de alienação fiduciária superveniente, pois se entende que esta modalidade pode ser compreendida como garantia real, §10º do art. 22 da lei 9514/97:
§ 10. O disposto no § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, beneficia todos os credores fiduciários, mesmo aqueles decorrentes da alienação fiduciária da propriedade superveniente. (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
Se houver a liquidação pelo Credor Fiduciário Superveniente do saldo devedor do Credor Fiduciário, ele se sub-roga também no crédito e na garantia preferencial gravada no bem.
§ 5º O credor fiduciário que pagar a dívida do devedor fiduciante comum ficará sub-rogado no crédito e na propriedade fiduciária em garantia, nos termos do inciso I do caput do art. 346 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil). (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
Não há necessidade de anuência do Credor anterior para realização da alienação superveniente, mas o Credor Superveniente deve declarar que possui ciência do registro de AF anterior.
Consolidada a propriedade pelo Credor Fiduciário, a expectativa dos demais Credores Supervenientes sobre o bem se findará e os demais registros cancelados, por lógica. O único dever que o credor fiduciário de grau anterior terá perante os demais é de lhes distribuir eventual sobra de dinheiro havida pela venda extrajudicial do bem, conforme art. 10 da Lei 14.711/23.
Entretanto, o valor que se espera “sobejar” sobre este bem poderá também inexistir em razão de possível arrematação por valor inclusive de até 50% da avaliação em 2º leilão, se assim o Credor aceitar:
Art. 27, § 2º - No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que seja igual ou superior ao valor integral da dívida garantida pela alienação fiduciária, das despesas, inclusive emolumentos cartorários, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais, podendo, caso não haja lance que alcance referido valor, ser aceito pelo credor fiduciário, a seu exclusivo critério, lance que corresponda a, pelo menos, metade do valor de avaliação do bem. (Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
Ademais, identificamos outras fragilidades no que concerne a esta “expectativa” pelos Credores Supervenientes, haja vista que a própria Lei confere em seu artigo 26-A, a quitação em caso de frustração dos leilões, não havendo qualquer saldo a ser devolvido ao Devedor Fiduciante – como consequência, nada a receber o Credor Superveniente:
§ 4º Se no segundo leilão não houver lance que atenda ao referencial mínimo para arrematação estabelecido no § 3º deste artigo, a dívida será considerada extinta, com recíproca quitação, hipótese em que o credor ficará investido da livre disponibilidade. (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
O tema é retomado no art. 27:
§ 4º Nos 5 (cinco) dias que se seguirem à venda do imóvel no leilão,(APENAS SE VENDIDO – GRIFO NOSSO) o credor entregará ao fiduciante a importância que sobejar, nela compreendido o valor da indenização de benfeitorias, depois de deduzidos os valores da dívida, das despesas e dos encargos de que trata o § 3º deste artigo, o que importará em recíproca quitação, hipótese em que não se aplica o disposto na parte final do art. 516 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil). (Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 5º Se no segundo leilão não houver lance que atenda ao referencial mínimo para arrematação estabelecido no § 2º, o fiduciário ficará investido na livre disponibilidade do imóvel e exonerado da obrigação de que trata o § 4º deste artigo. (Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
O efetivo processo de pagamento ao Credor Superveniente ainda demanda muitas dúvidas e pelas pesquisas podemos observar que até junto aos Cartórios de Registro de Imóveis este cenário parece um tanto nebuloso. Recomendamos que antes de ser adotada esta modalidade de garantia, é de suma importância compreender como o CRI de competência do imóvel vem atuando frente a esta inovação trazida pela lei.
De toda forma, embora se trate de um instituto que permite um melhor aproveitamento das Garantias por outros Credores e auxiliando o fomento do fornecimento de crédito no mercado, verificamos que o Credor Fiduciário Superveniente não deterá a garantia de adquirir o bem e/ou receber qualquer importância referente a produto do contrato preferencial quando adotar esta modalidade, contudo, diante do cenário de uma possível Recuperação Judicial, o registro deste gravame se torna extremamente vantajoso face à natureza extraconcursal desta operação.
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